29.9.21

AINDA NÃO

 AINDA NÃO A minha cor preferida é o amarelo! .....O verde!.....O azul! Não ando sempre pela esquerda! Não como sempre pão com manteiga ao pequeno-almoço! A minha arte é assim! Vive de momentos, de desafios! Ao fim de muitos anos, sei o quanto vale e, sobretudo, que o vale para mim. Pinto para mim desde sempre e tenho a sorte de o poder partilhar com outras pessoas. Não me defino por um movimento artístico, pois pinto o que gosto, e em todas as variantes possíveis. Não alinho em grandes discussões filosóficas sobre o meu trabalho pois o que me importa é o ato e o momento em que me encontro com a pincelada final numa obra. Um tema nunca está acabado pois dá início a algo mais. Cada trabalho que faço é um exercício, um desafio. O início. De um outro! Procuro sempre mais...... algo duradouro numa época em que se banaliza tudo que existe de profundo.


6.2.13


Colaboração com Luisa Peixoto em Paris para a celebração do projecto 15 anos, 15 objectos, 15 artistas. Depois de comemorar 15 anos em 2012, Luísa Peixoto apresentou, na ultima edição da Maison&Object, Paris

13.10.12



“SOURCE BOOK” PINTURA
SÃOMAMEDE
GALERIA DE ARTE
MAIO A JUNHO DE 2005

“Free search”,2005,Técnica mista sb tela,100 x 100 cm
“Don’t look”,2004,Acrílico sb tela,60 x 60 cm


BONITO POR DENTRO
para o Luís Melo
parte um
na casa dos meus avós maternos, em são cristóvão de selho, havia uma raposa embalsamada na sala. a sala, sempre escura, era um lugar proibido, e nem tanto porque a minha avó quisesse preservar os cristais pousados na mesa ou a limpeza imaculada dos tapetes, era mais porque nós, as crianças, percebíamos o reluz dos olhos daquele bicho e nos incomodava que nos visse. era verdade que não eram os dentes afiados, boca aberta ameaçadora, que nos afligiam, eram os olhos sobre tudo. sempre abertos, como furos em cima das nossas cabeças. incidiam como se abrindo caminho para o pensamento, para a nossa inquietação. eu perguntava à minha avó se tinha sido o meu avô a caçar a eterna raposa, ela dizia que sim, mas era mentira, queria apenas que nos convencêssemos dele como alguém menos agastado do que aquele doente, como o vimos por tantos anos até morrer. mas o certo é que a raposa era o centro daquela sala e, para mim, de toda a casa, pois se os olhos se mantinham abertos, era igual a uma luz que se tivesse acesa, ou como se, dia e noite, em vigília, aquele bicho vivesse, à revelia dos outros. mesmo quando todos dormiam, o bicho vivia por igual e sabia de coisas que ninguém sabia. nas poucas vezes que ali dormi, no chão dos quartos por alturas do natal, tantos tios e primos ali alojados, eu pregava mal no sono, lembrando-me da raposa com certo nervosismo. não a imaginava a andar – quem sabia viria ter comigo ali entre cobertores – eu sentia-a apenas, como se, de facto, deixássemos uma luz acesa ou, pior, o fogão ligado, ou a porta aberta, ou outra coisa que ficasse perigosamente desarrumada, alguma coisa simplesmente perigosa. um dia, na nossa casa em paços de ferreira, pensando inusitadamente sobre o assunto, tive um pressentimento estranho de que dentro da raposa alguém guardara algo. algo que se quisesse proteger de quem não o merecesse, como algo a que só acedesse quem tivesse coragem para enfiar a mão, entre os caninos tão afiados e garganta abaixo, e alcançar jóia ou segredo mais valioso. na primeira oportunidade, estive um tempo em redor da raposa à espera de entender se a minha mão entraria um pouco além do que se via. a garganta do bicho era estreita, e tinha medo de, forçando um pouco, rasgar o caminho e destruir, para minha desgraça absoluta, o objecto. compreenda-se, aquele era o objecto dos objectos. e tive medo da ideia. cismei que poderia merecer o que lá estivesse, mas nem assim a repugnância de tocar o interior do bicho mo deixava fazê-lo. fui apanhado em grande concentração por uma tia minha. não estava a fazer nada, olhava apenas e ela perguntou, não tens medo, e eu respondi, tenho, e porque não foges daí, repetiu, e eu disse, porque dentro das coisas mais feias podem estar tesouros. os piratas escondem os baús nas grutas mais escuras. a minha tia sorriu e respondeu, ou como o sapo que era um príncipe. quando a minha tia saiu da sala, no silencio absoluto e assegurado de que ninguém me haveria de surpreender, beijei a raposa abaixo do olho direito. esperei um segundo e não aconteceu nada. tive a certeza de que enlouqueci de burrice, foi quando me deu um ataque de pânico e desatei a correr dali para fora, incapaz de me livrar da sensação asquerosa do pêlo daquele monstro nos meus lábios. chorei, agarrado às saias da minha mãe, e respondi à minha avó que a raposa da sala tinha feitiço. no meu coração, senti que estava enfeitiçada e me tinha convencido de que era bonita por dentro. a minha mãe puxou-me ao colo e sorriu. alguém disse, tu é que és bonito por dentro. acalmei aquecido à lareira. sem saber, fiquei à espera que alguém viesse e, com um beijo, soltasse o príncipe cá dentro. imaginei que o ondular do fogo me escondia um pouco o rosto, e o vermelho da pele já não era o corado da vergonha, mas o calor a atiçar o sangue. talvez a beijá-lo à sua invulgar maneira.
“Pretty on the inside”,2004,Acrílico sb tela,60 x 60 cm
parte dois
quando vi, pela primeira vez, o quadro de luís melo de um sapo pintado sob o buraco de uma fechadura com a frase «pretty on the inside», revivi a história da minha raposa embalsamada, e achei que a ideia de «bonito por dentro» seria valiosa para entender os excelentes resultados da arte deste pintor. se um príncipe encantado é a beleza interior de um sapo, na maioria dos quadros de luís melo o interior é remetido, não só, para lá dos olhares infantis que pinta, mas também aquém das grades, normalmente floreadas, apostas aos rostos. para dentro dessas janelas da alma o quadro radica a sua particular ambiência.é sobretudo através do olhar que os seus trabalhos participam no espaço, é por eles que se definem como serenos ou angustiados, como se, de fora e desse modo, se visse melhor ou pior a beleza interior. por isto, aquela estranheza de uma vigília constante também se põe. porque estes quadros se mantêm acordados para lá de nós, acusando silenciosamente a assistência de muito do que se nos esconde em segredo. os quadros de luís melo são iguais à raposa, são iguais ao centro da casa, definindo um ponto de luz constante, percebendo tempo todo, eternos, o tempo da casa que só momentaneamente nos pertence. por outro lado, anulando algum efeito volumétrico pela aposição de desenhos de cariz gráfico, luís melo, constrói grades quase metálicas sobre os olhos puros. grades que mais não fazem senão transformar os próprios rostos em algo interior, como o sapo a ser beijado. de facto, as figuras por detrás das rendas dessa espécie de ferro forjado aprisionam-se nessa forma, reflectindo, pela pureza do olhar, esse sinal de tesouro por dentro, como ansiosas por um beijo que as revele. num certo sentido, as figuras de luís melo são portadoras de príncipes encantados, como devem ser as grandes obras de arte, dotadas de conteúdo suficientemente espantoso e em mistério, que, ao beijo de cada espectador, se revelem em infinitas nuances. sapo sob sapo, estamos nestes quadros como a destapar um constante desfile de hipóteses, levantando sentimentos bons e maus, num processo rico de emoção. quer pela beleza sensível, quer pela dureza e angústia de algumas expressões, a relação com o trabalho deste pintor é sempre marcada pela emoção, fazendo apelo à íntima fragilidade de cada um, como se cada um se colocasse no ponto de beijar e ser beijado. assim se explica essa impressionante sensação de entendermos que o quadro é quem fica em vigília, reparando em nós talvez mais do que nós nele, vendo-nos obsessivamente, esperando-nos em cada ínfimo cruzamento de olhares. nessa combustão permanente, em que se tornam os olhares das suas personagens, pode a casa encontrar fonte de luz inesgotável. a arte tem de ser isto, um inesgotável modo de provocar vida na matéria. uma inesgotável vida, interagindo com a nossa em permanente revelação e segredo, como satisfazendo por um lado e recusando por outro, para que se liberte e prenda de nós, e para que nós nos tenhamos assim também, livres e presos dela, permanentemente mudando o que sabemos dela e de nós próprios. luís melo estabelece uma das mais belas propostas da nova pintura portuguesa, revelando¬se um magnífico seguidor de fábulas, apostando no deslumbre por fora e também, pela carga emotiva empregue, no bonito por dentro. bonito por dentro, de onde os príncipes gritam por corações atentos que os saibam descobrir.
valter hugo mãe
“Basic camouflage”,2004,Acrílico sb tela,60 x 60 cm

“Insiders guide”,2004,Acrílico sb tela,60 x 60 cm




“So why can’t I do what you can too!”,2005,Técnica mista sb tela,120 x [100 + 100] cm
“Map 2”,2004,Acrílico sb tela,100 x 100 cm
“Nobody”,2004,Acrílico sb tela,100 x 100 cm
“Pretty on the inside II”,2005,Acrílico sb tela,30 x [30 + 30] cm




“One apart”,2005,Acrílico sb tela,30 x [30 + 30] cm





Jardins de Bruma

A Pintura de Luís Melo





Assim me vem, da bruma das distâncias,
plena de pormenor:
o lago, o barco de papel, esse jardim,
o inquieto rosto de menina,
mais o olhar triste e ansioso que imagina
o lago – o mar, a brisa – vendaval,
que impele e leva o barco ao porto fabuloso
onde a vida é diferente e irreal.

Maria Manuela Couto Viana – “Ingénuo Tema” – Menina Mansa e Outras Poesias.



Na trans-lucidez do olhar das personagens da pintura de Luís Melo desenham-se os jardins de bruma da nossa infância, domínio encantado de sensações perdidas que regressam, ecos nimbados de ouro, vozes secretas de um veludo que se ruboriza de esplendores matinais. Olhares lúcidos, lânguidos e transparentes de meninos que não cresceram e não crescerão nunca, tempo cristalizado do mito, infância florescendo numa Primavera imóvel, cheia de melancolia.

    Um espaço de pura evasão e inexpugnável doçura, uma fortaleza delicada, um berço de subtis delícias, sem tréguas, prolongando a esperança, aguardando a surpresa e a explosão de frutos já outonais. Flora miraculosa crescendo da sombra, coração da luz e do silêncio, desenhando os seus ritmos, os seus vértices de encantamento. Realidade adormecida, flor do sonho, irreal jardim da bruma com as suas flores abrindo pétalas de silêncio dourado. Contenção, pausa, encantamento, um silêncio mais doce, uma doçura lenta e audaciosa, escrita suspensa de grafias elementares, musicais.

    A infância é um lugar de imagens e de visitação, de sensações nascentes, cálidos milagres. Nos braços de cristal da minha infância atravessei os desertos da alma e as clareiras da ausência. Entretinha-me vendo os desenhos da luz e os arabescos da espuma mais branca do que a brancura, o mundo vinha à existência numa gota de água e nascia no espanto de um desejo tão puro e tão forte como o ímpeto da vida. O irromper da luz e o seu ocaso tinham o mesmo perfume. O mar era berço e dança infinita e as suas dádivas enchiam os meus olhos de estrelas e os minhas mãos de conchas e pequenos universos. A infância, alma cristalina, raiz amanhecida, “porto fabuloso onde a vida é diferente e irreal”, ponto onde tudo começa, intemporal início, espalha os seus vestígios de oiro, a sua prata nupcial, e realidade e sonho vêm à existência num momento único e eterno. Irrealidade é então igual a real, ao real mais real dos poetas e dos inocentes. Saibamos apreciar esse esplendor oculto, essa lição de sabedoria dos momentos felizes, aqueles que não terminam nunca e que a infância, a nossa, guarda, aguarda. Saibamos hoje decifrar o silêncio, o ouro, a prata, o jardim de bruma que Luís Melo uma vez mais, generosamente, cultivou para nós. Não apenas para nosso prazer e deleite, mas para nos fazer rasgar os gestos automáticos do quotidiano, abrindo-nos as portas de um reino que é também o seu e onde os nossos passos há muito ficaram gravados.

    Reino do olhar virgem e do bater do coração ao ritmo do universo. Reino de descoberta e contemplação, lago profundo dos mil caminhos do olhar, onde se misturam a terra, o ar, a água, o ouro, fogo líquido, tesouro submerso e visionário. Reino de um silêncio cheio de promessas, de uma alegria prometida.


                                Maria João Fernandes
       

31.8.11

Retrato

"Eu não tinha este rosto de hoje,
assim calmo, assim triste, assim magro,
nem estes olhos tão vazios, nem o lábio amargo.
Eu não tinha estas mãos sem força,
tão paradas e frias e mortas;
eu não tinha este coração que nem se mostra.
Eu não dei por esta mudança,
tão simples, tão certa, tão fácil:
Em que espelho ficou perdida a minha face?"

Cecília Meireles

Cada um de nós tende para si próprio como escala pelos outros.

28.8.11

O RIO DA POSSE
Que todos somos diferentes, é um axioma da nossa naturalidade. Só nos parecemos de longe, na proporção, portanto, em que não somos nós.
A vida é, por isso, para os indefinidos, só podem conviver os que nunca se definem, e são, um e outro, ninguém.


Fernando Pessoa in “Livro do Desassossego”

27.8.11

Blogger Reflexo d'Alma disse...
Luis...sua foto lembrou
a frase que
tenho refletido dia a noite:
"Nossas asas crescem quando não cabem mais na gente"
E sua imagem tem como que asas nos sapatos,
como será que não percebi que é nos pés que devemos tê-las para correr para perto dos que amamos e para longe dos que nos fazem sofrer...
Para perto das certezas e longe do incerto...
Para os braços que nos acariciam e para longe dos que nos ferem...
Para perto e para longe...
Asas nos pés e não somente na imaginação...

Me faz refletir muito nesse momento ímpar que vivo desde ontem.

Asas nos pés...

7.11.10

5.11.10

4.11.10

3.11.10

"Seek & Hide" - Inaugura a 6 de Novembro de 2010, pelas 16.00h na galeria Artes Solar Stº António

"Seek & Hide"
Inaugura a 6 de Novembro de 2010, pelas 16.00h
na galeria Artes Solar Stº António

29.10.10


Cada um de nós tende para si próprio como escala pelos outros.

Fernando Pessoa in “Livro do Desassossego”

2.10.10

"Seek & Hide" - Inaugura a 6 de Novembro na galeria Artes Solar Stº António

O RIO DA POSSE
Que todos somos diferentes, é um axioma da nossa naturalidade. Só nos parecemos de longe, na proporção, portanto, em que não somos nós.
A vida é, por isso, para os indefinidos, só podem conviver os que nunca se definem, e são, um e outro, ninguém.


Fernando Pessoa in “Livro do Desassossego”

29.9.10